segunda-feira, 20 de fevereiro de 2006

N.

"Eu escrevi belos livros",
disse Nietzsche
à sua irmã nazi
louco de sífilis.

E não disse mais nada.

Nietzsche está morto
(é claro, assim como Deus),
mas pelo menos escreveu
seus próprios livros.


- Lauro Marques

sexta-feira, 17 de fevereiro de 2006

Eu bem sei que me queres burguês, atarefado e pagador de nossas contas.

Recuso-me a ser escritor de fim de semana. Escrevo só durante eu trabalho. (Trabalho só durante eu escrevo.)

O vôo rasante da borboleta sobre a água. Um toque só de asa e adeus.

Eles não gostam. Compreendi agora porque. Ignoram a elipse.

quarta-feira, 15 de fevereiro de 2006

Idéia para uma cena usando o poema "Fábula".
Preto e branco (Final de tarde):

Um grupo de homens, entre eles, um calvo, e mulheres, 5 ou 6 pessoas, vestidos de branco, envoltos em mantos, como se fossem seguidores de Zoroastro (mas que podiam ser foliões de carnaval, ou hare-krishnas) tocando instrumentos (pandeiro, flauta), entoando o poema (à maneira de um mantra), passa numa estrada que sobe uma montanha por um homem sentado à beira do caminho, que veste calça jeans, e parece não se importar com o grupo, não se mexe (talvez tenha um livro nas mãos -a definir qual- e um caderno em que rabisque algo).

A câmara acompanha a passagem em travelling. A última frase que se ouve é um pedaço do poema:
No alto daquela montanha ... à noite gris .... no meio de
nenhum lugar...há pássaros


Corta.

Como seria filmada a cena:

1. Câmera fixa no homem parado em primeiro plano.

2. À Aproximação do grupo (pela esquerda), a câmera recua (para uma abertura maior) e passa a acompanhar a passagem das pessoas em travelling.


Penso agora que em lugar de um homem, poderia ser uma bela garota, com um livro e um caderno de notas, na cena que bolei para "Fábula". O livro: Ulysses, JJ, na edição da Penguin.

O que ela estaria anotando? "Smart girls writing something catch the eye at once. Everyone dying to know what she’s writing."

terça-feira, 14 de fevereiro de 2006

Match Point

O filme de Woody Allen cala a boca dos críticos que ano passado, por não terem ainda visto este último de 2005 (pois os filmes de Allen só chegam ao Brasil com um ano de atraso), ou por pura preguiça intelectual, acusavam o autor de "esgotamento criativo".

Trata-se do "filme inglês" de Allen. Ele finalmente conseguiu fazer um drama, com uma pitada de suspense, que se compara e até supera as comédias anteriores. Quase como se fosse um Hitchcok culto, com referências a Sófocles e Dostoievski.

Não percam a cena inicial: a bola de tênis quica na rede e pode cair de um lado ou de outro da quadra, no ponto final que definirá o jogo. Reparem no cartaz, a letra O de Point, ali está o toque de gênio. Quem assistir verá.

sexta-feira, 10 de fevereiro de 2006


Se algum dia eu for publicar o livro Balada Para um Morto, será esta a capa.



TORRE DO SILÊNCIO -IRÃ

Bom, terei de encontrar antes o autor. A foto achei-a aqui:
http://www.ancientroute.com/Monument/Tombs/TwrSilnc.htm

Certa feita, o poeta Affonso Romano escreveu-me a respeito de uns tanto poemas e de Fábula (ver a seguir):

"Siga em frente, meu caro Zaratrusta de Mossoró (desculpe a brincadeira*): é que no Irã subi a montanha do Templo do Silêncio onde seguidores de Zoroastro celebravam há 2.500 seu culto."

"A coincidência, Lauro, está em que no topo do Templo, havia realmente um iraniano com uma pomba branca nas mãos, assustadíssimos, os dois.
Affonso."


FÁBULA

No alto daquela montanha
à noite gris
no meio de
nenhum lugar
há pássaros
de pio lento
e raro
estofo negro &
pálido
matiz―
que voam longe
e só pousam
para descansar.
- Lauro Marques

_______________
* o poeta viveu 10 anos em Mossoró-RN.

terça-feira, 7 de fevereiro de 2006

Atrapalhamentos ao triste. Editado 10/1/2006

Urge achar o auto-engano. A força que nos permite olhar o espelho e aceitar, com encanto, a imagem que envelhece.

Acho que Adorno está errado. E certo ao mesmo tempo, afinal, ele estava onde estava, testemunho e cumplicidade ao mesmo tempo. Celan não aguentou o silêncio do "filósofo" Heidegger e saltou no rio. Também o Primo Lévy, mas acho que nada a ver com Heidegger; ou, quem sabe, tudo a ver. E aquele Adorno, meio gordote, em suas papapadas roliças a vociferar contra os poetas. Claro que ele estava em erro. Claro que ele estava certo.

Veja, meu caro poeta Lauro, alternância, este o ritmo. Uma gangorra sutil. Nem tanto ao relinchar dos dentes, nem tanto ao choro dos olhos. O belo poema de H. Dobal que lhe trago neste texto que preciso atualizar.
http://www.jornaldepoesia.jor.br/disseram10.html
Os que vão morrer te saúdam! A ti os deuses permitiram testemunhar a morte.

- - Soares Feitosa
____________________________
«Feio como o cão do segundo livro!»
Aqui está ele, de Felisberto de Carvalho:
www.jornaldepoesia.jor.br/francisco150.html

Aprecio a resposta rápida, meus olhos pregados na tela (écran) desde as 9 da manhã (manha, mainha), três cervejas escuras e uma clara, neste noite que só escurece e chove, il pleuve, parce qui'l faut, chove, pois é preciso, sim, alternância, mas diante da morte?
Abrirei os links a-manhã.
Atque in perpetuum, frater, ave atque vale! [Catulo, Carmina 101.10]. E para
sempre, irmão, salve e adeus! 2766.


Lauro

Hoje

Os poemas da Besta, já havia lido esse seu ensaio, envio um poema meu da besta ou seria da "Queda?" (tenho vários), acho que vc já conhece, é paródia de Yeats, The Human Child.

http://amacula2.blogspot.com/2005/10/sumrio-de-em-certezas.html

Fico com a primeira alternativa. Não existe. Ou se existe é um cretino. A resposta deu Saramago. Deus criou o homem para escapar da solidão. Depois também enfadou-se dele (isto é, de nós).

O homem-bomba, talvez vá a ver um filme agora, cujo roteiro é muito semelhante ao que traduziu Archer, "Paradise Now".

Li seus grifos ao médico-monstro. No meu poema também os pássaros cantam em celebração à vitória da vida sobre a morte.

MAS os pássaros são muito superiores a nós.
Sobretudo, desliga logo a televisão!
(Precisamos de visões aproximadas muito mais do que "tele" -que
significa "longe"- visões).

Depois de Auschwitz

Terry Eagleton diz em A Ideologia da Estética (Jorge Zahar, R$ 45,00), que uma das diferenças na análise inaugurada por Adorno diz respeito à forma como o corpo é encarado. Não mais como fonte de prazer, mas de dor.

Dor era o que sentia o homem baleado sob minha janela. Mas, estranhamente, ele não emitia nenhum som.

Impossível não pensar na "contaminação" estética da vida cotidiana. Algo imoral. Éramos "contempladores". Tudo parece adquirir um clima farsesco. Até o assassinato ao vivo de um ser humano. Mas não era assim na Roma antiga dos Césares? As pessoas também não aplaudiam os "atores"?

segunda-feira, 6 de fevereiro de 2006

São Paulo, 452 anos.

12 milhões de pessoas.
3,5 milhões de pobres.
Indigentes (situação de extrema necessidade material, sem-tetos, etc): 1,75 milhão.

Seria interessante vê-los em fila, para uma foto. A maior das américas.

quinta-feira, 2 de fevereiro de 2006

Desta vez eu vi tudo. Da minha janela no trabalho no Pátio do Colégio (bem onde nasceu a cidade de São Paulo, 452 anos atrás). Fugindo da polícia. Jovemjogado no chão. Pardos, os dois. Seis ou sete tiros ("São fogos?" "Gente desocupada!"). Pegou na barriga. Caído se contorcendo. O policial pegou-lhe pela metade do corpo, puxou pelo cinto, sacudiu como se fosse um pacote (à procura de arma?), pisou nos genitais ("Vai morrer, vagabundo!") e chutou-lhe a perna. Centenas de pessoas olhando dos prédios, Secretaria da Justiça, Segurança Pública, ao redor. Arrancou-lhe uma bolsa (pochette) (roubada?) e exibiu vitorioso. Levaram numa radiopatrulha. Rua sem saída. Brasil.

Soube agora que estava armado (dizem). O que muda?

Há pouco chovia. Vai precisar de outra chuva.

Um leve rumor quando o levaram. Penso mesmo que escutei aplausos.

Morto, de fato. Dizem que atirou primeiro, após ter agredido a socos e roubado uma senhora.