quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

Artistas/Los Artistas/Artists

Artistas

Foi em dezembro do ano passado
Eu parei para cumprimentar um grupo de operários
que haviam acabado de decorar (após horas) a Avenida
com bolas, pingentes e toda a sorte de penduricalhos iluminados.
- Parabéns! Eu disse. Ficou muito bonito.
- Obrigado - eles agradeceram, por detrás de seus capacetes e roupas cinzas
e voltaram para os seus bairros pobres e mal-iluminados.

Artistas

Fue en diciembre del año pasado
Me detuve a saludar a un grupo de trabajadores
que acababa de terminar la decoración (después de horas) de la Avenida
con bolas, colgantes y todo tipo de baratijas iluminadas.
- ¡Enhorabuena! Yo dice. Es hermoso.
- Gracias -  ellos agradecieran, por detrás de sus cascos y ropas grises
y regresaron a sus barrios pobres y con poca luz.

Artists

It was in December last year
I stopped to greet a group of workers
who had just finished decorating (after hours) the Avenue
with balls, pendants and all sorts of illuminated trinkets.
- Congratulations! I said. It's beautiful.
- Thanks - they thanked, behind their helmets and ash clothes
and returned to their poor and dimly lit neighborhoods.

domingo, 20 de fevereiro de 2011

Poema em vermelho


Eu quis escrever um poema em vermelho com todas as

qualidades que o vermelho tem: a textura, a luz, o som, a urgência e a intensidade  que o vermelho tem
Porque estou cansado de poemas azuis ou amarelos Eu quis escrever um poema em vermelho.




Red Poem

I wanted to write a poem in red
with all the qualities that red has:
texture, light, sound, urgency and intensity that red has


Because I'm tired of  blue poems or yellow
I wanted to write a poem in red.




LM

quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

Notas soltas - Poesia

A poesia não tem recuos e avanços. Ela – é, permanece. Depois de retirar sua atuação “social”, é impossível deixá-la sem a plenitude vital e humana, do aprofundamento, de ser autônoma. E então? –Ela pode evidentemente aprofundar-se também naquelas esferas em que o sono atua com tamanha intensidade. “Ousar” permanecer no sono, enriquecer-se em seu domínio, comunicar-se com ele – nisto, se quiserem, é lenta certeza da poesia em si mesma – ela não necessita que lhe façam “indicações”, que lhe “permitam” e que a controlem (também é assim, e em concordância, o seu leitor).


Será que a poesia perde ou adquire algo em tais condições? Seria desejável deixar isso como uma pergunta formulada. O mais importante: ela sobrevive. Expulse-a pela porta, ela se esgueira pela janela.

Guenádi Aigui. Sono e poesia.


Deixe-me colocar-lhe uma questão, senhor Breton. Todos conhecemos a noite e os dois lados que todas as noites têm: a noite dentro de casa e a noite fora de casa. Ou seja: há a tranquilidade e o esperado e há, ainda, o medo e a estranheza. Claro que se poderá sempre dizer que a poesia não se encontra nem em um lado nem no outro: a noite tem dois lados e a poesia é a porta da casa no momento em que é aberta e o escuro cobre a relva e o céu. Mas quando alguém tem medo, deve correr para casa; e quando sente tédio, deve correr para a parte de fora da noite. E a poesia, que parece uma coisa parada, resolve, ao mesmo tempo, o tédio e o medo; o que é bom e dois, sendo uma única, a poesia.

 Gonçalo M. Tavares. O Senhor Breton e a entrevista.

domingo, 6 de fevereiro de 2011

Releituras de Guenádi Aigui

Em 2008 publiquei uma leitura minha de um poema de Aigui, na Revista Bula. (Clique para ir para a página da revista). Na época, eu escrevi "poeta russo", mas o correto é "tchuvache" (a Tchuváchia é uma república autonônoma da Ex-URSS). Utilizei uma tradução de George Yurievitch Ribeiro, que eu considero ainda melhor que a que nos dá agora Boris Schnaiderman, para os mesmos versos, publicada na recente e belíssima coletânea de textos da editora Perspectiva “Guenádi Aigui: Silêncio e Clamor”.

Disse melhor, mas na verdade, relendo, agora, deveria ter dito que as duas traduções são complementares. A de GYR era para mim mais familiar, daí o estranhamento. Como não entendo russo, fica difícil julgar. As traduções iniciam de modo diferente, mas depois seguem mais ou menos juntas. Fica merecendo um estudo posterior. A título de comparação, leia-se os versos iniciais, pelos dois tradutores: "no clarão/ da angústia desfeita em pó" (BS); "no invisível crepúsculo/ de saudade pulverizada" (GYR). Na segunda tradução, a presença da palavra invisível (que não deixa de ser sugerida na primeira), marcou minha leitura do poema.

O conhecimento da biografia do autor também serviria para uma leitura do poema em questão, chamado "Silêncio", quando sabemos que o poeta foi levado ao ostracismo na Rússia, por não se adequar às diretrizes do realismo socialista. Veja-se, sobre isso, os versos, que vem imediatamente após os dois primeiros citados no parágrafo anterior, e são um testemunho da coragem e da firmeza de princípios do autor em relação à sua arte:


“conheço o inútil como os pobres conhecem a última roupa

e trastes antigos

e sei que essa inutilidade

é justamente a de que o país necessita de mim” (GYR)


Muito semelhante é essa passagem na nova tradução, de BS:


“conheço o desnecessário como os pobres conhecem a

roupa última

e os velhos trastes

e sei que este desnecessário

é o que o país precisa de mim”

Em um outro poema de Aigui, chamado “O Nosso”, traduzido na coletânea organizada por BS, a poesia, que neste poema é também sono e silêncio do poeta, é colocada ao lado da verdade, em favor da vida, num contraponto à mentira – reservada para o Estado.