domingo, 28 de agosto de 2011

segunda-feira, 22 de agosto de 2011

Thought / Pensamento

But we can't
avoid the dew
when evening falls -
thought is like a landing.
Again and again at
the same point,
being different.
What has changed
in the mean-
time between a verse and
another, what can I
say of your
eyes?



PENSAMENTO

Mas não podemos
evitar
o sereno
quando a tarde cai –
o pensamento é como um pouso.
De novo e sempre
no mesmo ponto,
sendo diferente.
O que mudou nesse meio-
tempo entre um verso e
outro, que posso Eu
dizer de seus
olhos?





LM

quarta-feira, 17 de agosto de 2011

Despertar de inverno




Hoje, despertei e, de olhos vendados, ainda,
não conseguia sentir o bater do meu pulso.
Fazia muito escuro então
e só o canto de um solitário
pássaro
madrugador
provou que eu ainda
continuava vivo.



 WINTER AWAKENING


Today, I woke up and blindfolded, still,
I could not feel the beating of my pulse.
It was very dark yet
and only the singing of a solitary
bird
early bird
proved that I was still
alive.





LM





*Dedicated to Charles Bukowski, in hell.
 By the way, it's a black sparrow up there.

terça-feira, 16 de agosto de 2011

A moveable feast



“Não, quem somos nós, afinal?”,
perguntou a mulher de Hemingway
encerrando uma discussão sobre
passear, preparar um lanche, beber vinho e ir para as corridas apostar em cavalos ou
empregar o dinheiro em coisas menos
dignificantes
como
comprar roupas ou
chuveiros ou
banheiras ou
vasos sanitários com descarga
no quarto.

E eu me senti, irresistivelmente,
apaixonado
pela mulher de Hemingway.


LM

quarta-feira, 10 de agosto de 2011

Um poema de Gelman e uma tentativa de tradução crítica

O poeta e o tradutor na arena da poesia

El tajo

La poesía no hace
que algo suceda, dijo W. H. Auden.
Apenas sobrevive, dijo.
No dijo por qué. Sobrevive como
sobrevive la imposibilidad.
Es decir, nuestro amor,
o el bisonte que hace cruces en la arena
olvidado de sus dientes de leche.
Es bello eso. Significa
que el frío de conocerse
puede tener otro destino.
Lo que nadie dijo
está bajo las máscaras
que la verdad necesita.
Mis ganas de dar besos y palabras
son un cuarto muy grande donde
se sienta absurdamente el corazón.
Es decir, sobrevive.
En el tajo de sus corrientes extrañas.

Juan Gelman


Uma tentativa de tradução:

O talho

A poesia não faz
com que algo suceda, disse W. H. Auden.
Apenas sobrevive, disse.
Não disse por quê. Sobrevive como
sobrevive a impossibilidade.
Quer dizer, nosso amor,
ou o bisonte que recruza a arena
esquecido de seus dentes de leite.
É belo isso. Significa
que o frio de conhecer-se
pode ter outro destino.
O que ninguém disse
está sob as máscaras
que a verdade necessita.
Minhas ganas de dar beijos e palavras
são um quarto muito grande onde
assenta-se absurdamente o coração.
Quer dizer, sobrevive.
No talho de suas correntes estranhas.

Lauro Marques

O poema é riquíssimo em analogias semiocultas ou caladas (que ninguém disse).
 
"Talho" aqui é sulco (como o rastro de um rio de "correntes estranhas") e ferida, rasgo (a imagem evocada pelo bisonte/touro).

O bisonte "faz cruzes", cruza, ou perambula pela areia (arena) esquecido de seus "dentes de leite" (de sua juventude/fragilidade), que tanto pode ser uma demonstração de coragem - não podemos resistir aqui a sublinhar a sugestão implícita de 'hace cruces"/"hace muertes" -, como de desorientação, embotamento ou desconhecimento de si.

O coração se senta e assenta-se num quarto muito grande onde se sente o coração.

Assenta-se absurdamente (a imagem é de inadequação, desconforto ou desproporção). Ou, dito de outra forma: o coração é pequeno demais para conter os desejos do poeta, que apesar disso, sobrevive, como a poesia e o touro na arena e a impossibilidade do amor.  

sexta-feira, 5 de agosto de 2011

quinta-feira, 4 de agosto de 2011

DEZ MANEIRAS DE SE ENTRAR NUMA CASA


Em uma das dez (ou quiçá 12, mas só direi das dez) realidades possíveis, ele atravessou o jardim, sentindo o cheiro perfumado da noite, e foi abatido - assim que o seu pé direito tocou no batente da porta - por um tiro de espingarda, vindo da janela de cima. Numa segunda realidade, um cão da raça fila, enorme e negro, ficou observando-o, parado, por cerca de dois minutos, até que, num único salto, estraçalhou sua jugular. Numa terceira possibilidade, quando terminou de pular o muro, escutou três vezes o pio de uma coruja e tomou isso como um mau agouro, dando meia-volta e escalando para fora, de novo, o muro. Numa quarta e hipotética possibilidade, o celular tocou, quando estava para pular o muro da casa; era sua mãe e ele havia esquecido de desejar-lhe parabéns pelos 70 anos. Numa quinta hipótese, o alarme disparou e ele foi pego em seguida, após uma perseguição, no terceiro quarteirão. Numa sexta, colocou a mão no bolso e havia esquecido a arma. Numa sétima, estava sem bala. Numa oitava, escorregou e caiu, quebrando a clavícula. Quando acordou, alguém chutava-lhe a cara. Numa nona, ele teve que matar toda a família. Numa décima, a porta estava aberta, não havia ninguém em casa, as luzes todas acesas, o cofre vazio e, quando saiu, foi recebido a tiros pela polícia.