quarta-feira, 28 de novembro de 2007

Desenvolvimento econômico à frente do social

O Estado de São Paulo
quarta-feira, 28 de novembro de 2007

Com atraso, Brasil entra no grupo de alto desenvolvimento humano
País alcançou 0,800 a passos lentos; renda melhorou, mas outros indicadores seguem em situação crítica


Lisandra Paraguassú e Lígia Formenti, BRASÍLIA

Pela primeira vez desde que foi divulgado o primeiro relatório do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), há 30 anos, o Brasil alcançou a pontuação 0,800, o que coloca o País na categoria do alto desenvolvimento humano. O relatório é de 2007, mas com base nos dados de 2005.

A própria Organização das Nações Unidas (ONU), que coleta as informações e faz o cálculo do índice, trata a conquista brasileira de maneira comedida.

Veja a evolução do IDH

"É simbólico. Há muito para se fazer", afirmou Flávio Comin, especialista em Desenvolvimento Humano e assessor do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud), que prepara o relatório do IDH. Só o Bolsa-Família, com a prática da transferência de renda, é que empurra o País para cima. A precariedade das políticas públicas de saúde, educação e saneamento não melhora significativamente a vida dos brasileiros.

Na comparação de índices sociais, o Brasil continua perdendo de países como Chile, Argentina, Uruguai e México. "Os números mostram que estamos no caminho correto, mas temos uma dívida social muito grande", afirmou Patrus Ananias, ministro do Desenvolvimento Social.

O Brasil chegou a um IDH 0,800, mas não conseguiu subir na comparação entre países. Era o 69º em 2006 (0,792). É o 70º neste ano, o último da linha de alto desenvolvimento humano. E chegou a esse estágio por conta de revisões na metodologia de cálculo dos dados, descobrindo-se que Albânia e Arábia Saudita têm situações melhores que a brasileira.

O grupo de médio desenvolvimento, onde sempre esteve o Brasil, vai de 0,500 a 0,799, enquanto os países com baixo desenvolvimento - a maioria, do continente africano - têm índices que chegam, no máximo, a 0,499.

EMPURRÃO ECONÔMICO

Um olhar mais atento sobre os números mostra que o Brasil melhora a passos muito lentos e, se avançou na economia, ainda deixa a desejar nos avanços sociais. É na comparação entre Produto Interno Bruto (PIB) per capita e o IDH que a real situação social do Brasil aparece.Nesse índice, números positivos significam que o desenvolvimento social do País é maior do que o desenvolvimento econômico. O número brasileiro é três negativo.

Países que o Brasil ultrapassou no ranking têm resultados melhores. É o caso da Venezuela, que tem uma pontuação 14, do Equador, com 21, e do Paraguai, com 10.

"No Brasil, o desenvolvimento econômico está à frente do desenvolvimento social. É preciso crescer renda, mas é preciso que se cresça numa velocidade maior nessas dimensões sociais", afirma o assessor do Pnud.

Se o País melhorou gradativamente em todos os índices que compõem o IDH (renda, educação e saúde) é o aspecto econômico que tem tido mais peso, especialmente depois da criação de programas de transferência de renda - políticas iniciadas no segundo mandato do presidente Fernando Henrique Cardoso (1999-2002), com a criação da chamada Rede de Proteção Social, e que foram consolidadas no governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a partir de 2004, com o Bolsa-Família, que unificou e expandiu a rede social.

Neste ano, a renda foi a única que teve crescimento real no Brasil. Saúde e educação tiveram índices melhores por conta de revisões de metodologias feitas pela ONU. O PIB per capita no Brasil passou de US$ 8.195 para US$ 8.402 (o dólar usado é o da Paridade de Poder de Compra, não o câmbio real).

Desse valor, US$ 130 são devidos à revisão dos dados, mas US$ 77 foi de crescimento real.No Índice de Pobreza Humana (IPH) - um cálculo que leva em conta a situação de saúde, renda e educação apenas da parte mais pobre da população -, o Brasil aparece em 23º lugar entre 108 países em desenvolvimento. Mas, quando se tira a renda da conta, o Brasil cai seis posições no ranking. Sobra um país em que ainda há uma enorme faixa da população analfabeta, com problemas de saneamento básico e mortalidades infantil e materna acima do aceitável.

ESPAÇO PARA OTIMISMO

Apesar dos problemas, a ONU aponta motivos para otimismo no Brasil. A previsão é que os relatórios dos próximos anos poderão trazer números melhores, resultado de investimentos atuais. "Uma coisa interessante é que houve redistribuição de renda nos últimos anos sem sacrifício da estabilidade econômica ou do crescimento", elogia Kevin Watkins, coordenador do relatório do IDH.

"Economistas freqüentemente dizem que não é possível distribuir renda com crescimento, mas o Brasil mostrou que isso pode acontecer."Mas Watkins faz cobranças. "Para que esse otimismo se confirme já se sabe que há requisitos relacionados ao crescimento econômico, redistribuição de terra e crédito e um sistema de impostos eficiente e igualitário", diz.

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