segunda-feira, 2 de janeiro de 2006

Finalmente me decido a ler o Saramago. Bem, fui forçado a tanto, uma vez que me presentearam com esses "Cadernos de Lanzarote" (Cia. das Letras, 1997). A verdade é que tenho desenvolvido certa predileção por esse tipo de literatura. Ouvi dizer que os diários de Virgínia Woolf superam em qualidade tudo mais que ela escreveu. Mas não posso e nem deveria confiar no que escutei de terceiros e espero também não estar induzindo ninguém a acreditar no que repito, apenas a título de curiosidade. Voltemos, pois, mais uma vez a Saramago. Há uma idéia, que me apetece, do diário como um "romance com uma só personagem". Transcrevo aqui essas palavras, do prefácio do autor, que aduzem algo a isso, de um modo que eu chamaria, um tanto pedantemente, de "semiótico-pragmaticista":

Porquê esses cadernos, se no limiar deles já se estão propondo suspeitas e justificando desconfianças? Um dia escrevi que tudo é autobiografia, que a vida de cada um de nós a estamos contando em tudo quanto fazemos e dizemos, nos gestos, na maneira como nos sentamos, como andamos e olhamos, como viramos a cabeça ou apanhamos um objeto do chão. Queria eu dizer então que, vivendo rodeado de sinais, nós próprios somos um sistema de sinais. Ora, trazido pelas circunstâncias a viver longe [...], senti (sempre começamos por sentir, depois é que passamos ao raciocínio) a necessidade de juntar aos sinais que me identificavam um certo olhar sobre mim mesmo. O olhar do espelho.

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