sexta-feira, 31 de outubro de 2008
Dois costureiros
― Vamos costurando nossas belezas ―disse.
― Sim, conquanto faremos uma bandeira e não uma mortalha... Um parangolé e não uma bandeira ―apressou-se em corrigir-se o segundo.
terça-feira, 21 de outubro de 2008
A performance
Pedro e Marta haviam combinado de irem juntos à abertura, cercada de mistério, da instalação do artista que estava causando sensação naquele momento na cidade. Mas Pedro tivera um problema no trabalho àquela tarde e chegara muito atrasado ao casarão transformado em galeria e local para exposições e performances como aquela. Chovia e ele procurou em vão Marta na pequena multidão que deixava o local às pressas, molhada e espavorida. Como não a encontrou, resolveu juntar-se ao segundo grupo que já se formava na fila de entrada.
O casarão ficava numa parte elevada e tinha uma construção bizarra por causa do terreno desnivelado. Antes de chegar à porta principal passava-se por uma piscina ladeada por paredes altas, localizada na parte abaixo do casarão, e um muro lateral por onde subia uma escada de degraus largos, cercada de jardins.
Passando pela porta, chegava-se às muitas salas. Um recepcionista mudo entregou o programa a que se deveria assistir. Setas e placas apontavam a direção. O programa dividia-se em duas partes. Na primeira, em uma sala de cinema especialmente preparada era projetado um documentário fictício em preto-e-branco sobre vítimas da ditadura em um país latino-americano. Nos dois lados da sala havia máquinas, em torno de dez, metade em cada lado, que Pedro notou serem imitações de aparelhos mata-moscas eletrônicos de luz negra, que no início da sessão permaneciam apagados.
No final do filmete, falado em espanhol e português, que durou 15 minutos, os personagens principais reapareciam na tela e os que haviam sido torturados até à morte diziam seus nomes e iam lentamente desaparecendo da tela, quando, para cada menção, se acendia o mata-moscas fazendo o barulho característico de eletrocussão e um cheiro de carne queimada era exalado.
Em seguida, ia-se a outra sala onde um outro filme mostrava o próprio artista caracterizado de Little Richard cantando acompanhado por uma banda de músicos vestidos como gângsteres. No meio do show, a apresentação era interrompida e em seu lugar eram exibidas imagens do lado de fora. As imagens focavam as pessoas que tinham saído da sessão anterior deixando o local apressadamente, ao som de uma música marcial, descendo os degraus da escada atabalhoadamente, alguns corriam.
Canhões laser disparavam finos feixes de luz vermelha sobre as pessoas. Os feixes de laser eram seguidos de sons que imitavam balas sendo disparadas e barulhos de detonação e pessoas gritando. No meio daquela confusão, Pedro pôde distinguir Marta, num momento em que quase caiu e olhou para trás, a câmera aproximou seu rosto num close.
Por fim, as luzes se acenderam, a música terminou e era a vez dos que tinham assistido ao filme sair para a rua. Pedro tentou ligar para Marta, mas do outro lado do celular ninguém atendeu a ligação.
Chovia mais forte quando ele deixou o casarão, o que tornou a “escapada” ainda mais dramática. Pedro abriu o guarda-chuva preto iluminado por fora pelo canhão de luz vermelha em meio aos estampidos, silvos e gritos e forçou a passagem pelo grupo que ia mais à frente.
O casarão ficava numa parte elevada e tinha uma construção bizarra por causa do terreno desnivelado. Antes de chegar à porta principal passava-se por uma piscina ladeada por paredes altas, localizada na parte abaixo do casarão, e um muro lateral por onde subia uma escada de degraus largos, cercada de jardins.
Passando pela porta, chegava-se às muitas salas. Um recepcionista mudo entregou o programa a que se deveria assistir. Setas e placas apontavam a direção. O programa dividia-se em duas partes. Na primeira, em uma sala de cinema especialmente preparada era projetado um documentário fictício em preto-e-branco sobre vítimas da ditadura em um país latino-americano. Nos dois lados da sala havia máquinas, em torno de dez, metade em cada lado, que Pedro notou serem imitações de aparelhos mata-moscas eletrônicos de luz negra, que no início da sessão permaneciam apagados.
No final do filmete, falado em espanhol e português, que durou 15 minutos, os personagens principais reapareciam na tela e os que haviam sido torturados até à morte diziam seus nomes e iam lentamente desaparecendo da tela, quando, para cada menção, se acendia o mata-moscas fazendo o barulho característico de eletrocussão e um cheiro de carne queimada era exalado.
Em seguida, ia-se a outra sala onde um outro filme mostrava o próprio artista caracterizado de Little Richard cantando acompanhado por uma banda de músicos vestidos como gângsteres. No meio do show, a apresentação era interrompida e em seu lugar eram exibidas imagens do lado de fora. As imagens focavam as pessoas que tinham saído da sessão anterior deixando o local apressadamente, ao som de uma música marcial, descendo os degraus da escada atabalhoadamente, alguns corriam.
Canhões laser disparavam finos feixes de luz vermelha sobre as pessoas. Os feixes de laser eram seguidos de sons que imitavam balas sendo disparadas e barulhos de detonação e pessoas gritando. No meio daquela confusão, Pedro pôde distinguir Marta, num momento em que quase caiu e olhou para trás, a câmera aproximou seu rosto num close.
Por fim, as luzes se acenderam, a música terminou e era a vez dos que tinham assistido ao filme sair para a rua. Pedro tentou ligar para Marta, mas do outro lado do celular ninguém atendeu a ligação.
Chovia mais forte quando ele deixou o casarão, o que tornou a “escapada” ainda mais dramática. Pedro abriu o guarda-chuva preto iluminado por fora pelo canhão de luz vermelha em meio aos estampidos, silvos e gritos e forçou a passagem pelo grupo que ia mais à frente.
segunda-feira, 13 de outubro de 2008
Cidade do México - Diário de viagem
Frida Kahlo por Antonio Gironella |
(Instantâneos)
-escrito em portuñol selvagem-
-escrito em portuñol selvagem-
Xochimilco: Pântano Azteca de águas oscuras. Aquí hay gente que vive aislada. A mãe levando de balsa, remando, seus filhos para la escuela. Nosotros y los mexicanos bebiendo frescas cervezas. Tristes-alegres, “valsam”. Noches Buenas*, los terribles Mariachis e bem no fundo, quase não se notam, emplumados para la guerra, eles nos olham.
Teotihuacan: Das casas de palha e barro, nenhum vestígio. Palácios, um rei morou aqui. Do alto da pirâmide, larga vista para o vale de los muertos ―“camelando” sus últimas bugigangas.
Centro, Catedral: Silêncio. No centro, à entrada, de interior negro, Jesus Del Veneno, oscuro, pende de la cruz, como se pendesse de um galho, antes dos outros santos e altares. Tudo alto y dependurado. Cheiro incenso ―mais silêncio, intenso, vindo de fora, da praça, um canto, irreproduzível, la-la-la-la, de tristeza amplificada de micrófono, alegre y desesperada. Um campesino escuta a si próprio na sala reservada, a conversar com estátuas, que lhe olham, e a si mesmas, assustadas, em su silencio de luto e de madera.
Palácio de Belas-Artes: Fuera los santos! Catedral (in)útil onde se odeia/adora el hombre: de novo Rivera, Orozco ―um rasgo en las paredes, mejor que los murales, gigantescos y tirânicos: Gironella, pinturas que son un corte y sangran.
Calle Francisco de Souza: O ocre cor de terra das casas da calle Francisco de Souza, hijos de la Malinche, também tingida de azul cobalto y Frida, que eu não vi, as aquarelas do museu de aquarela...
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* "Noche Buena" é o nome de uma cerveja mexicana, do tipo premium, escura, de edição limitada e lançada nos meses de outubro a dezembro para ser consumida na noite de Natal (a "Nochebuena", como é chamada). É também o nome de uma flor vermelha estampada no invólucro da cerveja.
quinta-feira, 2 de outubro de 2008
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