terça-feira, 28 de junho de 2011

Poema de finados



Este será um grande poema

feito de pequenos acontecimentos.



Componho fragmentos no escuro, que é vida

e dou minhas fugas para a arte como quem diz chega!

e toda a tristeza do mundo nas calças do empregado de escritório com um botão faltando, a caminho do trabalho

e eu também metido em minhas “calças momentâneas”, qual Vallejo, pensando:

[Será triste ser isso?]



O pássaro enlouquecido, kamikase, num ato de desespero político e lírico, na batalha invisível, que os pássaros travam com as janelas e a cidade 

não esperou o final da Primavera e mergulhou com a cabeça para baixo no vidro da porta da sala que separa a rua da casa, com um estampido surdo, quebrando o silêncio consagrado, no dia de finados

foi condecorado por bravura e estupidez e devidamente sepultado, sem maiores ritos nem pompas

numa caixa de papelão contendo pétalas e com a seguinte inscrição: “pássaro morto, 1º de novembro de 2010”

na lata de lixo orgânico do edifício



[E a vida continua, tanto para nós como para os pássaros]



As maritacas indiferentes a tudo a não ser a si mesmas, vieram, como de costume, bicar seus grãos de girassol.



[e os empregados de trabalho.]





Poema de Lauro Marques

Fotos de Alberto Pucheu

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